No início do ano de 1171 DC, o Imperador Bizantino Manuel I Komnenos decidiu atacar um dos seus aliados, a então pequena cidade de Veneza.
O Império Bizantino era ainda um dos maiores Impérios à face da Terra, e Veneza apenas uma pequena cidade, apostada essencialmente em negociar produtos que os outros países precisavam. Comprar, transportar e vender, ganhando dinheiro com isso. Uma de apenas duas formas que a Humanidade encontrou, até hoje, de aumentar a riqueza.
Bizâncio e Veneza eram, de tal forma aliados, que Bizâncio apoiava militarmente os venezianos, em qualquer conflito. Existiam cerca de 10.000 venezianos a viver no Império Bizantino, nomeadamente em Constantinopla, sede do Império.
Um dia, Manuel I terá acordado mal disposto e decidiu que os venezianos o estavam a enganar. O Líder de Veneza (curiosamente intitulado de “Doge”) tentou negociar uma paz, mas não foi bem sucedido. Manuel I mandou prender os venezianos que habitavam Constantinopla, e houve algumas escaramuças militares.
Mas o problema foi que obviamente, o comércio entre as duas nações parou. O dinheiro deixou de fluir, os produtos de chegar, e Veneza encontrou outros mercados. Vendeu os seus produtos em outros mercados, com benefício, e o Império deixou de poder contar com alguns produtos, que efetivamente lhe fizeram falta. O que o Império consumiu em recursos com esta guerra ajudou ao declínio inevitável, que continuou por mais dois séculos, até serem conquistados pelos Otomanos.
Existe uma certa tendência dos líderes dos Impérios de pensarem que os seus Impérios têm uma capacidade negocial infinita. Que basta dizer “salta” e os outros perguntarem a que altura.
Estamos a assistir a uma série de ameaças que o Império Americano (em declínio) está a apresentar a vários países, e que estão a aceitar as condições em tempo recorde. A aceitação de deportados no caso da Colômbia, e o policiamento da fronteira, no caso do México, contra a ameaça de tarifas aplicadas contra os produtos do seu país.
É óbvio que uma proposta destas, de um momento para o outro, tem que ser aceite. É uma oferta que não pode ser recusada. A possibilidade de reduzir drasticamente todo o comércio de um país como a Colômbia ou o México para o seu principal parceiro comercial é um risco que ninguém quer correr. Mas é um aviso. Um aviso de que do outro lado existe alguém que luta sujo, e que coloca em cima da mesa ameaças extremamente desproporcionais. Aceitar 100 pessoas de volta contra ter tarifas em todos os produtos que um país exporta é uma proposta desonesta e não proporcional, e que só pode ser feita por quem tem uma posição dominante.
Os Estados Unidos têm uma posição dominante por duas razões: uma é a moeda que ainda é a utilizada pela maior parte do mundo, para fazer transações entre os vários países. Esta necessidade de dólares em todo o mundo permite que os Estados Unidos continuem a imprimir o seu dinheiro à medida do que eles próprios precisam, e a aproveitar-se disso.
Mas esta posição dominante está a acabar. A China e a Rússia estão a apostar fortemente em conseguir que muitos dos seus produtos sejam negociados nas suas próprias moedas. A China já compra energia em outras moedas que não o dólar, e a Rússia já vende a sua energia em outras moedas que não o dólar (e também o Euro, já agora).
A segunda razão para os Estados Unidos manterem a sua posição dominante é a força. E a força é a segunda forma (para além do trabalho e do comércio) que a Humanidade conhece de aumentar a riqueza. Mas enriquecer através da força é caro - é necessário pagar e manter exércitos maiores do que os dos inimigos - e é uma forma de enriquecimento em que apenas uma das partes beneficia. Tecnicamente, enriquecer pela força é um roubo, a forma mais fácil de os Governos parecerem relevantes.
O que se vê das rápidas decisões dos vários “Líderes” que têm sido alvo do bullying de Donald Trump é que estão a ser colocados perante “ofertas que não podem recusar”, e por isso rapidamente capitulam.
Mas tal como nas escaramuças que todos nós tivemos na escola quando éramos mais novos, das duas uma: ou se tornam maiores e aprendem Krav Maga, ou vão chamar o irmão mais velho, que é cinturão negro de Karaté.
FAFO, motherfucker.