Nacionalismo em Portugal: Um Projeto de Dominação Misógino e Autoritário
O nacionalismo em Portugal, ao longo da sua história, tem se configurado não apenas como uma expressão política, mas como um projeto de dominação e controle social.
Em todas as suas formas mais radicais, desde o nacionalismo místico até os movimentos neonacionalistas contemporâneos, o nacionalismo português tem sido profundamente misógino, autoritário e racista. Este artigo examina como essas correntes têm usado a misoginia, o racismo e outras formas de opressão como pilares do seu projeto de poder, moldando a sociedade portuguesa de maneira a reforçar hierarquias e estruturas conservadoras.
Nacionalismo Místico e Integralismo Lusitano: A Mulher e a Submissão como Valores Fundamentais
O nacionalismo místico português surgiu no final do século XIX e início do século XX como uma vertente que combinava a exaltação de uma identidade nacional espiritual e transcendente com a defesa de um Portugal idealizado, essencialmente monárquico e católico. Esta vertente nacionalista associava a nação à ideia de uma missão histórica quase mística, defendendo uma visão de unidade e pureza nacional que precisava ser protegida contra os "perigos" da modernidade e da mudança social.
Dentro deste contexto, o Integralismo Lusitano, uma das expressões mais concretas do nacionalismo místico, defendia uma ordem hierárquica, onde o papel da mulher era relegado ao espaço doméstico, como guardiã da moralidade e da "pureza" da nação. O Integralismo não via a mulher como sujeito autónomo, mas como instrumento de reprodução dos valores tradicionais e católicos, submetida à autoridade masculina. Este movimento defendia uma sociedade patriarcal, onde a mulher, além de mãe, era também símbolo de uma nação "pura" e moralmente intransigente.
Paralelamente, a visão mística e nacionalista estava intimamente ligada ao racismo eugenista, com o medo da miscigenação sendo um dos pilares do pensamento integralista. O nacionalismo místico e o Integralismo Lusitano viam a "pureza racial" como essencial para manter a força e a estabilidade da nação portuguesa, rejeitando qualquer elemento externo que pudesse "corromper" essa pureza, o que incluía tanto as mulheres como as minorias étnicas.
Estado Novo: A Misoginia e o Colonialismo Como Políticas de Estado
Durante o regime do Estado Novo (1933-1974), a ideologia nacionalista portuguesa consolidou-se sob uma forma autoritária, cujos princípios eram muito próximos dos do nacionalismo místico e do Integralismo Lusitano. A mulher, mais uma vez, foi vista como uma figura submissa ao homem e à pátria, com a maternidade e a vida doméstica sendo apresentadas como funções "naturais" e essenciais para a estabilidade social.
Salazar e os seus seguidores promoveram uma visão patriarcal da sociedade, onde as mulheres eram valorizadas apenas pelo seu papel na reprodução da ordem moral e na transmissão dos valores católicos. A misoginia era parte integrante da construção de uma ordem social rígida e controlada, que visava manter o status quo e esmagar qualquer forma de subversão.
Além disso, o regime salazarista não hesitou em aplicar uma política colonial que também se baseava no racismo. A "missão civilizadora" do império português justificava a exploração e subordinação de povos colonizados, e a ideia de que os portugueses eram uma raça superior era defendida abertamente, alimentando um discurso eugenista que negava a diversidade racial e cultural das suas colónias. Esta política colonial estava fortemente ligada a uma visão de uma nação homogénea, limpa de influências "estranhas", incluindo, claro, a miscigenação.
Neonacionalismo Contemporâneo: A Retórica Misógina e Racista do Presente
Nos últimos anos, assistimos ao ressurgimento de correntes neonacionalistas em Portugal, como o movimento Chega (E restantes satélites), que embora tentem disfarçar as suas intenções por trás de discursos modernizados, ainda perpetuam as mesmas ideias autoritárias e misóginas do passado. A retórica de defesa da "família tradicional", do "combate à decadência moral" e da "proteção da identidade nacional" é uma tentativa de restaurar uma ordem patriarcal, onde as mulheres são novamente reduzidas ao papel de suporte doméstico, sem voz no espaço público.
A xenofobia e o racismo continuam a ser centrais neste discurso, com uma ênfase particular na rejeição da imigração e na glorificação de uma cultura portuguesa supostamente "pura" e homogénea. O medo da miscigenação e da diversidade cultural, tão presentes no nacionalismo místico e no Integralismo, ressurgem como um fator de coesão para estes movimentos. O discurso de "preservação cultural" é frequentemente disfarçado de forma a não parecer explicitamente racista, mas ainda assim perpetua a exclusão de tudo o que não se encaixa na sua visão estereotipada da nação.
A Misoginia e o Racismo como Fundamentos do Autoritarismo Nacionalista
O ponto comum entre todas as formas de nacionalismo em Portugal é a sua base em hierarquias e na submissão. A mulher é vista como um elemento subordinado que deve aceitar o seu papel no domínio privado, protegendo e transmitindo os valores da nação, enquanto as outras culturas e etnias são vistas como "ameaças" à integridade nacional. Esta ideologia visa não apenas manter a ordem social, mas também reforçar um sistema autoritário onde a liberdade individual é negada em favor de um bem comum imposto.
É preciso entender que o nacionalismo português não se limita à sua estética ou aos seus símbolos, mas é, antes de tudo, uma ferramenta de controle. A misoginia e o racismo não são meras manifestações periféricas, mas sim os pilares sobre os quais se constrói este projeto autoritário.
O nacionalismo em Portugal, seja na sua vertente mística, no Integralismo ou nos movimentos neonacionalistas atuais, sempre se alicerçou na misoginia, no racismo e no controle social. Em cada uma das suas manifestações, a mulher é colocada num papel submisso, e a diversidade é vista como uma ameaça à "pureza" nacional. Este nacionalismo não tem qualquer interesse na liberdade individual, nem no progresso das relações sociais. Ao contrário, ele busca a perpetuação de uma ordem hierárquica que mantém a mulher e as minorias subjugadas. Contra essas forças, é essencial que se ergam vozes que rejeitem não apenas os seus discursos, mas também a sua ideia de uma nação homogénea e autoritária, onde não há lugar para a diversidade e para a emancipação.
Luís Dias