Sou homem de Guimarães e desde pequeno que me foi ensinado que a cidade vive de si e per si e que o poder central só é útil quando a cidade o achar útil. Este pensamento está patente na pequena frase que se ouve nas bocas do povo “Portugal é Guimarães e o restante são conquistas”.
Na nossa história como cidade, temos toda uma série de momentos onde os seus habitantes se revelaram contra o poder. Certamente que todos pensam na nossa origem, quando D. Afonso Henriques desafiou o seu Rei, o Rei de Castela e Leon. Mas mais histórias há, sendo uma muito marcante porque vivida, quando a cidade se revelou contra o governo fascista, ao recebemos o ministro de costas voltadas, obrigando o ministro dar a volta para cumprimentar os representantes da cidade. (uma história longa, que pode ser lida aqui).
Mas será que esta característica é intrínseca a alguns milhares de portugueses (povo de Guimarães), somente porque nasceram numa terra “prometida”?
A história de Portugal tem referências a essa luta permanente do povo contra o poder, desde Viriato, a Maria da Fonte, da Padeira de Aljubarrota ao Zé do Telhado. Mas também as terras e as pessoas têm práticas ou dizeres que definem a sua independência, Fafe com a sua célebre frase “Com Fafe ninguém Fanfe” a imagem da justiça popular, ou já no séc. XIX a célebre imagem do Zé Povinho, desenhada representando o povo e a sua atitude perante os impostos cobrados, ou por exemplo, a forma como as pessoas do Soito e de Quadrazais que ainda hoje olham de revés para as autoridades, porque foram perseguidas e presas, simplesmente por estarem a fazer pela vida, levando e trazendo mercadorias de Espanha.
Conforme aqui demonstro, temos na nossa história exemplos de que de uma forma ou de outra, transversalmente ao longo do país, o povo não aceita nem nunca aceitou o poder central, fosse ele o monarca, fosse ele o estado.
Mas vem a velha pergunta, mas como fazemos as coisas e mantemos a organização da sociedade, sem esse ser supremo, o estado?
Também aí precisamos de desmitificar o seu papel. Alexandre Herculano, um dos maiores pensadores do liberalismo em Portugal, quando da revolução de 1820, quis recriar os forais em Portugal, pois dizia que a única forma de um povo ser livre era retomar aos forais (predominaram na Idade Média e erradicados pelo Absolutismo de Marquês de Pombal). Um sistema único na Europa, onde cada vila e aldeia, viviam num regime de auto-organização sem que esta pudesse ser contestada pelo Rei.
Se a nossa história suporta o mais alto valor da liberdade, como a razão da sua existência, se a nossa história suporta reivindicação de autonomia social e de justiça, se a nossa história suporta a revolta contra quem através de impostos atente contra a nossa propriedade, então é porque temos na trilogia “Liberdade-Propriedade-Vida” a nossa razão de ser. Por isso posso afirmar; somos libertários, mas ainda não sabemos.
António Xavier
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